Hoje nos deparamos com uma política antiimigratória desumana dos Estados Unidos, que atinge milhares de famílias de paupérrimos mexicanos, assim como as de diversos países desconstruídos da América Central.
Acontece que, historicamente, existe uma série de fatores que ao mesmo tempo em que propiciaram, por um lado, a riqueza e a pujança da economia americana, por outro atuaram para que a pobreza e a decadência de diversos países se perpetuassem e se agudizassem perante o neoliberalismo triunfante. Estes fatores têm suas raízes em meados do século XIX e chama-se imperialismo.
Acentua com toda a correção Edmund Wilson, autor de “A sangreira Americana” (1961), que os americanos e sua mídia sempre chamaram de imperialismo os avanços sobre os países vizinhos da antiga Prússia, da Alemanha, da Turquia e, principalmente, da antiga U.R.S.S.. “Todavia é-nos difícil reconhecer que somos um país devorador, e que a linguagem que utilizamos é feita para enganar. Se quisermos realmente entender o tipo de papel que desempenhamos, teremos que olhar para trás e tentar ver objetivamente quais foram, no passado, nossas tendências e nossas práticas.”
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Mapa do México e U.S.A. -1824
Os Estados Unidos da América iniciaram sua expansão imediatamente após a expulsão dos ingleses. Compraram, logo a seguir, a Louisiana dos franceses e a Flórida dos espanhóis.
No Texas, parcela do território mexicano e sob o domínio espanhol, os norte-americanos iniciaram a invasão colonizadora. Quando o México se torna independente, os U.S. tentam comprá-lo, mas os mexicanos não querem vendê-lo. Os colonos americanos se organizam em milícias e expulsam de suas terras os mexicanos, proclamando a república independente do Texas, que mais tarde se juntaria aos U.S.A..
Se em conjunto com os ingleses, os norte-americanos fazem um acordo para assumirem o Estado do Óregon, o mesmo não ocorre com os desorganizados mexicanos, que vivem em intermináveis guerras internas e revoluções. Os U.S.A. não satisfeitos com o Texas, exigem o pagamento de milhões de dólares como indenizações por propriedades de americanos dentro do território mexicano que tinham sido destruídas em suas lutas internas, assim como por cada americano miliciano fuzilado após ter sido feito prisioneiro dos mexicanos. Os U.S.A. aceitariam como pagamento indenizatório todos os territórios mexicanos acima do Rio Grande, aliás, os mais produtivos em agricultura e pecuária, entendendo que tais territórios fariam parte do já expropriado Texas.
Em seguida os U.S.A. tentam comprar dos mexicanos a Califórnia, cuja parte norte e central já haviam sido invadidas por colonos, ditos pioneiros, num processo semelhante ao que ocorrera há duas décadas com o Texas.
Acontece que os mexicanos se recusaram a entregar aos U.S. tanto os territórios ao norte de Rio Grande quanto a Califórnia. Os norte-americanos enviaram tropas para ocupação militar, mas os mexicanos defenderam seu território. Os U.S.A. declararam guerra ao México.
As tropas americanas venceram o mal organizado, pouco disciplinado e pior armado exército mexicano e tomaram de assalto a capital, a cidade do México. Pelas armas os U.S.A. anexaram para si o Novo México, a Califórnia e todo o Oeste mexicano pouco povoado.
Com a invasão americana, a mais produtiva metade de todo o México passou a fazer parte dos U.S.A., à ponta das baionetas. O governo mexicano foi obrigado, sob pena de fuzilamento, a firmar um tratado pelo qual ficava estabelecido que, em compensação pelos territórios anexados, o México receberia a ridícula quantidade de quinze milhões de dólares, restando-lhe a metade mais desértica de próprio território!
Vale à pena citarmos um trecho da carta escrita por W. Gilmore Simms, em resposta ao posicionamento do Senador James Hammond, contrário à pirataria anexadora:
“O senhor não deve discorrer contra a glória militar. A guerra é o principal elemento da civilização moderna e o nosso destino é a conquista. De fato, a partir do momento em que para de ampliar seus domínios, uma nação se torna presa de um vizinho inferior. Os mexicanos estão na situação daqueles que Deus busca enlouquecê-los para depois destruí-los. Fazem de tudo para nos obrigar a conquista-los e reduzi-los à sua verdadeira importância como um povo. Preste atenção, Senador, nosso povo jamais cederá uma só polegada daquilo que tenha sido conquistado pelas armas ou pela negociação. Tem sangue anglo-normando em demasia nas veias.”
O passo seguinte dos norte-americanos foi a brutal repressão dos Estados Sulinos quando tentaram se libertar da União e estabelecerem um país próprio. O Sul escravocrata e o Norte industrializado haviam se tornado quase que duas nações diferentes, cada grupo buscando expandir-se à custa do outro, tal qual ocorria na Europa continental. O mito difundido pelo Norte tinha um nome, a libertação dos escravos, mas todos sabiam que isto era apenas um mito. O presidente Lincoln, que comandou a oposição à secessão, também forçou o Sul à rendição incondicional e total.
A agressividade dos Estados Unidos, então, era tão grande que obrigou o Canadá a estabelecer defesas em toda a sua linha fronteiriça, em aliança com franceses e ingleses.
O “Jovem América”, movimento supremacista dentro do Partido Democrata, através de seu líder, Stephen Douglas, defendia que, caso a oportunidade se oferecesse, os U.S.A. deveriam anexar todo o México, Cuba e demais países da América Central, em nome de Deus. “Poderemos continuar a expandir-nos à medida que a população cresça e exija mais espaço vital, até fazermos de todo o continente uma república de limites oceânicos. Sob a égide deste princípio, os Estados Unidos podem cumprir essa grande missão, esse destino que Deus nos assinalou.”
Terminada a Guerra de Secessão, os U.S.A. compraram da Rússia o Alasca, adquiriram as ilhas Midway e estabeleceram bases navais no Havaí e em Samoa, com o objetivo de controle do Pacífico.
Em 1898, os U.S. emitem um ultimatum para que a Espanha desocupe Cuba. Em seguida, forjam o afundamento do barco de guerra Maine. Preparam-se para a invasão da Ilha. Ao encontrarem resistência, a ilha é invadida e ocupada. Trezentos soldados americanos morrem em batalha, enquanto mais de 3.000, vítimas de febre amarela, também jamais deixariam o território invadido.
Em seguida, os U.S.A. tomam a ilha de Porto Rico, entrada estratégica da América Central e do Golfo do México, assim como as ilhas Guan.
Enquanto isso, sob as ordens do expansionista Theodore Roosevelt, o almirante Dewey é enviado à Filipinas, que também era uma possessão espanhola, com a missão de destruir a frota que protegia a baía de Manilha. Inicialmente os filipinos imaginavam que as tropas americanas os libertariam do jugo espanhole se confraternizaram. Quando perceberam que apenas mudavam de senhores, se rebelaram. As tropas americanas demoraram dois anos para sufocá-los, com um exército que chegou a 70.000 soldados, com ordem para executarem até mesmo crianças acima de dez anos de idade. O genocídio praticado pelos americanos reduziu a população filipina de 9 para 8 milhões de habitantes. Na crônica intitulada “Genocídios que não devem ser esquecidos”, http://proust.net.br/blog/?p=128, nos dedicamos mais detidamente na ação imperialista americana nas Filipinas.
Mais tarde, Roosevelt, agora presidente, articulou uma rebelião no Panamá, que pertencia à Colômbia, com intenção de apossar-se do estreito que permitiria a conexão do Atlântico com o Pacífico. E assim foi feito. O Panamá passou a ser um “protetorado” americano. A seguir, os U.S. invadiram e subjugaram o Haiti ( que havia sido o primeiro país latino-americano a libertar seus escravos) e a República Dominicana.
A questão com que abrimos o princípio dessa crônica deve se repetir: Com que direito Donald Trump deseja erguer um muro para isolar dos U.S.A, os herdeiros do paupérrimo território deixado aos mexicanos e a nações destruídas pela instituição de repúblicas bananeiras do século XX?