A última erupção do Vesúvio havia ocorrido em 1737 e um ano após o evento a montanha se mantinha calma. Pois foi após esta explosão que uma grande quantidade de estátuas e imagens foi encontrada por certo General d’ Elboeuf, amante de antiguidades, que as coletou e as entregou ao rei das Duas Sicílias, Carlos de Bourbon.
O rei, recém-casado com Maria Cristina, não se pode negar ao “capricho” da rainha que se encantara com a beleza das peças e desejava ainda mais “relíquias”. Ordenou o Rei que o chefe do Exército se encarregasse pessoalmente da expedição. Este, então, recrutou seus trabalhadores dentre os prisioneiros e com pólvora e ferramentas iniciou as perfurações a partir de um poço de exploração aberto pelo cuidadoso d’ Elboeuf.
Era preciso vencer mais de quinze metros de dura massa vulcânica. À custa de explosões e picaretas os corredores principiaram a ser abertos. Em determinado momento, a picareta tocou em metal e o golpe soou como um sino. Era o primeiro achado: três fragmentos de cavalos de bronze.
Somente então, o Exército chamou um especialista, o Marquês Venuti, diretor da Biblioteca Real, que passou a superintender as explorações posteriores.
Seguiu-se o achado de três esculturas de mármore, romanos vestidos de togas; depois, colunas pintadas e um cavalo inteiro de bronze de quatro metros de altura. O entusiasmado Marquês resolveu descer pessoalmente nas escavações e descobriu uma escada que o conduziu a uma inscrição em bronze onde se podia ler: “Theatrum Herculanense”, construído à custa de um mecenas de nome Rufus.
Estava descoberta uma cidade submersa, pois onde havia um teatro deveria existir uma cidade. O poço aberto por d’ Elboeuf apontava diretamente para o palco do teatro! E este estava repleto de estátuas que ali foram encontradas empilhadas uma sobre outras, porque uma formidável torrente de lava derrubara sobre o palco a parede do cenário de fundo, soterrando seus corpos de mármore, bronze e pedra para um repouso imaculado de dezessete séculos!
Desde o teatro, com a perfuração de mais cinco metros em meio à lava, a massa de pedras liquefeita e endurecida: e lá estava a Cidade de Herculano! Carlos de Bourbon, graças a Herculano, instalou um museu como jamais existira no mundo.
Tal como muitas vezes acontece na História e na vida dos homens, o mais difícil ocorre primeiro e o caminho mais longo é, não raramente, tido como o mais curto. O Cavaliere Alcubierre, engenheiro da corte, levou muito tempo para convencer o idoso monarca a transferir o local das escavações para o lugar que os sábios apontavam haver sido o lugar em que Pompeia existira e fora soterrada no mesmo dia que Herculano. Transcorreriam anos até se empreendessem os primeiros passos para a descoberta da cidade gêmea, coberta por “lapilli”, pequenas pedras vulcânicas que junto com cinzas a haviam soterrado, formando camadas muito mais fáceis de serem removidas com as ferramentas da época.
Em 1748, tiveram início as novas escavações e em seis dias foi encontrada uma primeira grande e maravilhosa pintura mural, absolutamente conservada. Na semana seguinte, o primeiro cadáver petrificado e, ao seu lado, as moedas de ouro e prata que o morto deixara escapar das mãos. Foi o que bastou para que as escavações perdessem o rumo e começassem por todos os lados.
Perdera-se o foco da descoberta trocada pela ganância real. Mal eles sabiam que, por incrível sorte, haviam chegado ao Fórum de Pompeia!
A vitória para Alcubierre era um problema técnico e de ganhos financeiros. Winckelmann (o primeiro verdadeiro cientista a estudar as cidades) diria alguns anos após que o engenheiro tinha tanto a ver com antiguidades quanto “a lua com os caranguejos”. De todo modo, quando os homens de Alcubierre chegaram à plateia de um anfiteatro, onde obviamente não encontraram ouro, prata ou estátuas, não o reconheceram como tal e o abandoram.
Escavaram para os lados de Herculano e próximos aos portões deram com uma Vila, que concluíram, sem nenhum critério, haver pertencido a Cícero. Nas paredes estavam afrescos maravilhosos que foram recortados e copiados. Uma vez feito isso e, na ausência de “valores maiores”, atulharam a Vila com entulho e a abandonaram.
As escavações em Pompeia foram praticamente foi abandonadas por mais alguns anos e as atenções dos exploradores se voltaram para a rica Herculano, onde descobriram um verdadeiro tesouro: uma biblioteca que fora usada pelo filósofo Filodemos, hoje chamada “Villa dei Papiri”.
Finalmente em 1754, descobriram ao lado sul de Pompeia os restos de túmulos e de muros antigos. A partir desse dia e até hoje, com poucas interrupções, prosseguiram as escavações nas duas cidades gêmeas.
Só conhecendo a espécie de catástrofe que desabou sobre as cidades, poderemos formar uma ideia do efeito que sua descoberta exerceu no século do pré-classicismo.
Em meados de agosto do ano 79 de nossa era, o Vesúvio deu sinais de princípios de erupção, da mesma maneira que o fizera tantas vezes. Naquela manhã de verão, as duas cidades estavam entregues as suas atividades matinais.
Entretanto, nas horas que precederam o dia 24, os sinais de uma catástrofe antes nunca vista tornaram-se evidentes. Com um trovão horrendo fendeu-se o ápice do monte. Uma coluna de fumaça subiu e abriu-se sob a cúpula do céu e, acompanhada de estrondos e relâmpagos, uma chuva de pedras e cinza precipitou, escurecendo o dia. Ao mesmo tempo, uma enchente inundou as ruas, não se sabendo se provinha da terra ou dos ares.
O fim de Pompeia e Herculano viriam de duas maneiras.
Um misto de chuva de cinzas e uma tromba d’água e lava vulcânica derramou-se sobre Herculano, penetrando por ruas e ruelas, portas e janelas, cobrindo a tudo e a todos.
Em Pompeia foi diferente, tudo começou com uma leve chuva de cinzas que era fácil sacudir; depois caíram os “lapilli”, seguidos por pedras de muitos quilos. Aí chegaram os vapores de enxofre, seguidos por gases de ácido sulfúrico. Os homens não tinham como respirar e se saíam de suas casas eram massacrados pelos “lapillis”, então, suas casas desabavam sob a pressão das pedras e se buscavam abrigo debaixo de pilastras os gases os matavam.
Passadas apenas quarenta e oito horas, o sol voltou a luzir e do vulcão apenas uma fina coluna de fumo era expelida. Pompeia e Herculano, tal e qual Sodoma e Gomorra no relato bíblico, haviam deixado de existir. Num círculo de dezoito quilômetros ao redor do Vesúvio, a paisagem estava arrasada, as campinas, cobertas. Partículas de cinza haviam voado até a África.
Na verdade é difícil imaginar uma possibilidade melhor que uma chuva de cinzas para conservar uma cidade em toda a sua azáfama da vida diária para a posteridade. Pompeia e Herculano não foram velhas cidades do passado, mortas pelo processo lento de extinção ou devastadas por conquistadores. Ali, cidades vivas foram tocadas subitamente pela varinha mágica e a lei do tempo, do vir a ser, do devir, perdeu sua validade.
Com as escavações, paulatinamente, começou a ser percebido o processo dramático e as informações dos antigos autores sobre a catástrofe, como as famosas cartas de Plínio, o jovem, ganharam vida em achados como o do porquinho que não chegou a sair do fogo, nem os pãezinhos, do forno.
Que história se oculta por trás dos restos de duas ossadas que ainda conservam as algemas de escravos? O sofrimento do cão, acorrentado, encontrado sob o teto de um aposento? Foram achadas mães que ainda seguravam no colo seus filhinhos, protegendo-os com pedaços dos seus véus, antes que fossem sufocados. Homens e mulheres que, reunindo seus tesouros, chegaram às portas de suas casas, sendo mortos pela saraivada de “lapillis”. “Cave canem” (cuidado com o cão), diz o mosaico em frente da casa onde duas mocinhas tombaram tentando a fuga.
Diante de Herculano foram encontrados corpos ao lado de corpos, carregados com utensílios domésticos. Num aposento soterrado estava uma senhora com seu cão. Enquanto o esqueleto do cão conservara-se, o de sua dona espalhara-se por todo o aposento. Teria a fome do cão, ao não morrer imediatamente, o obrigado a, no desespero, se alimentar do cadáver de sua dona?
Não longe dali, um banquete fúnebre fora interrompido e depois de dezessete séculos foram encontrados os convivas acomodados em seus canapés. Aqui, sete crianças a brincar num quarto, quando a morte as surpreendeu e ali, trinta e quatro pessoas às quais se juntara uma cabra no intento de salvação.
Exatamente como estavam no momento, habitadas e cheias de vida, assim foram encontradas as casas, o Templo de Ísis, o anfiteatro. Nas salas de escrever achavam-se tabuletas de cera; na biblioteca, rolos de papiro; nas oficinas, as ferramentas; nos banhos públicos, os pentes; sobre as mesas dos restaurantes, tigelas e o dinheiro deixado pelo último freguês que pagou. Nas paredes das casas, versos de amantes apaixonados ou desiludidos.
Nas paredes das Vilas maravilhosos afrescos que, no dizer de Venuti, “eram mais belos que as obras de Rafael”.
Pompeia e Herculano, no momento mesmo de sua catástrofe, legaram para a posteridade o conhecimento vivo de seus hábitos, costumes, seu modo de pensar e agir e suas magníficas manifestações artísticas.
Dessa forma, tornaram-se cidades imortais.