Cidade do México, maravilha civilizatória asteca, destruída em um ano, “em nome de Cristo”.

Hernán Cortez, aos dezoito anos de idade, desembarcou na ilha de Hispaniola, atual República Dominicana. Ao lhe perguntarem se desejava uma “hacienda” para cultivo da terra, respondeu que viera fazer muito dinheiro na América. Seis anos após, o aventureiro Cortez, sob o comando de Velasques, participou da conquista de Cuba, onde se tornou um experiente caçador e comerciante de índios escravizados.

Além de comerciante de carne indígena, ele também introduziu vindo da Europa, o primeiro gado bovino para abate no campo cubano. A partir de então, explorou minas de ouro, enfim, fez muito dinheiro.

O bispo dominicano Bartholomé de las Casas, que considerava serem os índios os verdadeiros donos do Novo Mundo, e que os espanhóis só deviam prestar o serviço da conversão ao cristianismo, declarou a respeito de Cortez, em carta ao bispo Cisneiros:

“Deus é quem sabe à custa de quantas vidas de índios ele acumulou tal fortuna e lhe pedirá contas ao fim de tudo!”

Mas Cortez na sua ânsia queria mais, ainda muito mais. Juntou seus castelhanos em ouro e aplicou-os em armamentos; obteve de Velazques o comando de uma esquadra de onze pequenos navios e partiu para a terra distante, onde se dizia que jorravam ouro e pedras preciosas. Em agosto de 1519 saiu de Cuba para a conquista da cidade do México, a capital da civilização mais avançada das Américas, e não somente das Américas, no século XVI: a Asteca!

Cortez comandava 553 soldados, 10 peças de artilharia e tinha 16 cavalos; sob o estandarte de veludo negro guarnecido com ouro, com uma cruz vermelha no centro, podia-se ler e a expressão “amigos, sigamos a Cruz e com esse sinal, se crermos, venceremos”. Durante três meses, ele e sua pequena tropa venceram os obstáculos das águas, do terreno, do clima e das doenças tropicais. Pelo caminho, travou batalha com alguns milhares de índios e os venceu. No seu caminhar, como sói acontecer na história, juntaram-se ao invasor ao redor de 6.000 índios, quase todos tlascaltecos, inimigos históricos dos astecas.

O comandante Cortez aliava à mais extrema brutalidade um tato político invejável. É difícil se entender a marcha tão gloriosa de um grupo reduzido de guerreiros, guiados exclusivamente pela cobiça, até às portas da grande cidade do México!

Sem dúvida o terror provocado entre os índios pelas armas de fogo deve ter sido um dos fatores decisivos, talvez em igual importância ao pavor que o cavalo provocava entre o povo. Existem mesmo versões que apontam para a crença, entre os astecas, de que os espanhóis seriam espécies de deuses ou semideuses.

O certo é que, durante seu caminhar, Cortez enviou diversas embaixadas com presentes e promessas de paz para o imperador asteca Montezuma. O que não se consegue entender é como Montezuma II, comandante em armas de mais de 100 mil guerreiros destemidos, chegou ao ponto de implorar que o bando de aventureiros e seus aliados não penetrassem na cidade sagrada!

Mas Cortez não lhe deu ouvidos e no dia 8 de novembro de 1519, entrou na cidade sem nenhuma resistência. Pelo contrário, ao chegar à grande rua central, viu vir ao seu encontro um cortejo de homens paramentados em ouro, prata e pedras preciosas, que conduziam ao centro uma liteira carregada nos ombros de nobres, com ninguém menos que o próprio Montezuma.

Ao olharem ao seu redor, os espanhóis mal podiam crer no que viam.

México era inovadora, linda, diferente, maravilhosa mesmo para olhos que teimavam tão somente em enxergar o que a cobiça e o roubo fossem capazes de carregar.

Quando Montezuma e Cortez se cumprimentaram e trocaram votos de amizade, foram dois mundos que se defrontavam. Um deles, entretanto estava fadado a desaparecer. Exatamente um ano após esse encontro, Montezuma estaria morto e a esplendorosa capital de toda uma civilização, totalmente destruída.

Disse o filósofo Spengler: “Este é o único exemplo de uma civilização que teve morte violenta, pois não definhou, não foi sufocada ou detida em seu progresso: foi assassinada em plena floração do seu desenvolvimento, destruída como um girassol cuja flor é cortada por um homem que passa”. Os homens somente voltariam a assistir a destruições semelhantes na “Era dos Imperialismos”, nos séculos XX e XXI.

No terceiro dia na capital asteca, Cortez pediu permissão ao imperador para construir uma capela na ala do palácio real destinado a ele e à sua gente. Montezuma não somente concordou como enviou operários para o ofício.

No entanto, não tardou que os espanhóis se deparassem com uma determinada parede cujo reboco parecia fresco. Durante a noite não tiveram pejo em derrubá-la. A parede escondia uma sala que comportava o tesouro real asteca! Cortez e seu lugar-tenente Alvarado não podiam crer no que viam tal a qualidade e a quantidade de adereços, ouro, pedras, pérolas e utensílios. Esperto como uma raposa, Cortez fez com que a parede fosse novamente fechada, à espera do seu golpe de mestre: o sequestro do próprio rei por seu bando de aventureiros.

E assim foi. Durante a missa inaugural da capela, enquanto os padres Olmedo e Diaz realizavam suas prédicas, o precioso convidado asteca, ladeado por homens armados, foi “intimado” a habitar a mesma ala palaciana onde viviam os invasores.

Depois do sequestro daquele que era considerado sagrado por seu povo, Cortez, sentindo-se protegido, não mais se conteve e ordenou que todo o tesouro fosse transportado para seu salão. Quando a soldadesca viu que somente em ouro o botim chegava a mais de 160 mil pesos, passou a exigir a divisão de todo ele em partes iguais, o que, entretanto, jamais passara pela cabeça do chefe. Ele separou as partes em quintos: um deles destinado a si próprio, os outros seriam para o rei de Espanha, para o governador de Hispaniola (que o odiava) e para pagamento das despesas da empreitada. A todos os soldados caberia um quinto. Chegou a haver um princípio de motim, mas que o aventureiro o soube controlar.

Enquanto isto, o governador de Hispaniola, sem ter conhecimento dos progressos da aventura de Cortez no México, havia enviado uma frota marítima para aprisioná-lo. Cortez ao tomar conhecimento do desembarque da mesma, ao invés de defender-se da expedição punitiva, deixou Pedro Alvarado com um terço das tropas, que mantiveram Montezuma em cativeiro, e partiu para o confronto.

A tropa comandada por Narvaez não contava com isso. Numa noite chuvosa, a surpresa do ataque destemido de Cortez eliminou a superioridade do inimigo. Após a morte de seu comandante, a tropa de Hispaniola juntou-se à do aventureiro e ele retornou, ainda mais poderoso, à cidade do México.

Pela primeira vez na história de suas conquistas os espanhóis não se deparavam com selvagens, como eles denominavam os aborígenes com quem até então haviam lidado. A começar por suas crenças religiosas. Os astecas possuíam uma religião politeísta muito bem estabelecida em costumes, rituais e crenças, com tendência a um monoteísmo hierarquizado. A etapa dos rituais primitivos como o culto dos deuses da natureza e da fecundidade, havia sido ultrapassada havia centenas de anos.

A civilização asteca, em seu conjunto, possuía uma íntima relação com a ciência do calendário, muito mais avançado que o dos europeus e que regia o dia a dia de todo um povo. Calendário com suas efemérides, estações do ano, previsão de estações chuvosas, dias sacralizados, etc..

A cidade do México alcançara no século XVI, um nível de planejamento urbanístico que as europeias pós-renascentistas tardariam pelo menos dois séculos para atingir.

O tráfego citadino era regulamentado, as ruas pavimentadas continham passeios públicos; a construção dos edifícios profanos e dos religiosos era pautada pelo fausto e pela funcionalidade.

A cidade era cortada por diques de água e tinha suas “chinampas”, ilhas flutuantes de flores.

O esgoto escoava por galerias subterrâneas e a água consumida pela população caminhava por dutos desde as montanhas, água límpida e pura dos degelos.

A população possuía, pasmemos, registro censitário!

A julgar pelos achados arqueológicos na região mexicana de Yucatan, onde viveu um povo vizinho dos astecas, os maias, a arte escultórica em pedra e cerâmica, de suma criatividade, era extremamente desenvolvida.

Mas os olhos do invasor eram induzidos, numa civilização tão diferente e superior à sua, a ver traços deixados pelo diabo, eles que se diziam representar Cristo. Isto facilitaria sua tarefa predadora e destruidora, característica de muitos impérios até nos dias de hoje.

É bem verdade que a religião asteca promovia holocaustos humanos, nos quais, cerimonialmente, os sacerdotes arrancavam dos peitos dos inimigos aprisionados o coração ainda a pulsar. Ora, os espanhóis escandalizavam-se com os “selvagens”, no preciso tempo em que a Sagrada Inquisição, sob Torquemada, enviava à fogueira em torno de 20.000 mulheres, somente na Espanha!

Enquanto Cortez esteve ausente combatendo Narvaez, os sacerdotes e o povo asteca pediram permissão a Alvarado para realizarem, no grande “teocale” (templo pirâmide), a festa anual de seu maior deus, Huitzilopochtli. O valente espanhol permitiu sob duas condições: não poderia ocorrer sacrifício humano e todos os presentes deveriam estar desarmados. No dia da cerimônia, ao redor dos 600 astecas, dentre os mais insignes, vergando seus mais preciosos ornamentos, deram início à cerimônia. No seu auge, um grupo de soldados espanhóis atacou-os, assassinando-os até o último homem. Uma testemunha escreveu: “O sangue pagão corria em torrentes como água produzida por forte aguaceiro”.

Ao retornar, Cortez encontrou um povo revoltado que sitiava o palácio onde Montezuma era mantido prisioneiro. Eles já haviam elegido Cuitlahuac como seu novo Imperador. Cortez, graças às suas hordas reforçadas conseguiu libertar Alvarado e, em represália, destruiu mais de trezentas casas, trucidando todos seus habitantes.

O povo asteca, em revolta, incendiou todas as pontes da cidade; por seu turno, Cortez destruiu o grande “teocale”. Foi seu grande erro. Agora a revolta popular contra os invasores era total!

Montezuma, inexplicavelmente, ainda tentou exercer um papel apaziguador perante sua gente. Morreu apedrejado por seu próprio povo, em junho de 1520.

As tropas invasoras, apossando-se dos tesouros e repartindo-os tentou a fuga, naquilo que ficou conhecido como a “triste noche”. Um punhado de espanhóis teria que furar o cerco composto por dez mil guerreiros. Da cidade, transformada num inferno de fogo e destruição, os espanhóis que conseguiram escapar não passavam da terça parte dos combatentes. Do tesouro de Montezuma somente pequena parte pode ser por eles carregada.

Escaparam da cidade, mas no campo foram cercados por forças ainda mais poderosas, perfeitamente organizadas, como eles jamais haviam visto antes. Foi quando Cortez deu outro golpe de mestre. Já ferido, em um segundo cavalo, pois o seu morrera, agrupou alguns guerreiros e partiu como uma seta para apontada para o peito do comandante de todas as tropas astecas, Cihaucu. O comandante segurava o emblema asteca, uma bandeira de malha de ouro. Na surpresa, Cortez conseguiu alcançá-lo e matá-lo.

As tropas astecas se desorganizaram e o incrível aconteceu: um punhado de homens consegui colocar em fuga todo um exército, desmoralizado pela morte de seu chefe!

Logo em seguida Cortez recebeu reforços de Cuba e de Hispaniola e voltou a atacar a cidade do México: ele e o rei de Espanha queriam por todos os modos a parte principal do tesouro de Montezuma que ficara na cidade!

Do lado asteca, o novo imperador, Cuitlahuac, logo morreu num ataque de varíola, graças aos vírus trazido pelos europeus. Seu sucessor, Quauhtemoc, com a idade de vinte e cinco anos, lutou bravamente por sua gente e civilização.

Finalmente, em dezembro de 1520, a cidade do México caiu em mãos dos espanhóis. Quauhtemoc foi feito prisioneiro, torturado com todos os instrumentos conhecidos pela Inquisição, mas nada contou sobre o tesouro de Montezuma. Enforcaram-no.

Até os dias de hoje, a maior parte daquele tesouro permanece desaparecido.

Os espanhóis destruíram casa a casa a maior cidade das Américas, incendiaram seus templos, destruíram seus deuses, atulharam os canais que antes abasteciam a cidade com água pura, destruíram as galerias de esgoto. Arrasaram cada espaço civilizatório que encontraram!

Trouxeram, então, duas mil famílias de espanhóis para a colonização cristã da cidade do México e, para eles deram 30.000 cabeças de índios escravizados. Atrás dos soldados com cavalos e espadas, seguiram os sacerdotes.

D. Juan de Zumarraga, o primeiro arcebispo do México, destruiu num gigantesco ato de fé, todos os escritos da civilização asteca que pode encontrar; bispos e padres imitaram-no e os soldados, com igual fanatismo, aniquilaram o que poderia restar.

Assim, utilizando-se do nome de Cristo, uma civilização foi totalmente decapitada em 1520, tudo no espaço de um ano!

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