Ele é um homem dos mares, um poeta das águas, e por assim ser, retém a estranha e misteriosa magia das criaturas marítimas, aquela das sereias, dos polvos e das lulas gigantescas que, ao mesmo tempo que nos atraem, causam certa repulsa: elas não nos são apreensíveis. Sou como todos os poetas das águas; costumamos perder a capacidade de encontrarmos a nós mesmos; além disso, poucos possuímos a habilidade de nos misturarmos aos outros humanos. Isso nos leva a dar as costas à vida e a mergulhar no abstrato, nos nossos próprios elementos. Por isso mesmo entendo Melville em suas entranhas. Talvez poucos poetas antes dele tenham detestado tão instintivamente a vida humana, ou melhor, a sociedade como a vivemos. Restava-lhe sempre a necessidade de lutar contra o mundo inteiro real, e, assim o fazendo, lutar também contra uma parcela do mais íntimo de seu ser. Mas esse é apenas o verso da moeda chamada Melville, pois ao mesmo tempo, ninguém esteve mais apaixonadamente repleto do sentido de vastidão e do mistério da vida não humana que ele.
No mar, assim como eu, ele busca sua fuga! Fugir, deixar a vida para trás, cruzar um horizonte que o levasse a uma outra vida, ao seu elementar. Quando Herman entra no oceano à bordo de um barco, encontra o seu ambiente natural, sua verdadeira casa. Na bagagem, muitas memórias, recordações daquele que atravessou o “Rubicon” da própria vida: ele não aceita mais a humanidade e ao não aceitá-la, deixa de sentir-se parte dela. Que lhe importa que a vida se fragmente, que até os acasalamentos e as procriações cessem? Que o tritão se afaste da fêmea, que o homem abandone sua fêmea e seus filhos e que as mulheres-sereias só se lambuzem com as águas? Com os lares desfeitos, corroídos, restam-lhe tão somente os elementos do imenso e interminável mar. Basta de terra para seres como Melville, Herman e eu próprio! Venham todos os elementos até nós, mas que eles nada tenham a ver com as complicações criadas pela humanidade. A nós, os párias do imenso, do velhíssimo oceano Atlântico ou do Pacífico, que se abre com todas as suas “porias” para os Argonautas dos séculos XIX e XX